Judiciário

Retomada do julgamento do recurso especial do Caso Kiss pode demorar até quatro meses

Autor: Laura Gomes

Retomada do julgamento do recurso especial do Caso Kiss pode demorar até quatro meses

Foto: Nathália Schneider (Diário)

Os ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que pediram mais prazo para analisar o recurso especial do Caso Kiss, têm até 90 dias para apresentar o voto que pode manter a liberdade ou restabelecer a condenação dos quatro réus. O prazo para o pedido de vista deve sofrer, ainda, suspensão no próximo mês, entre 2 e 31 de julho, em função do período de recesso. Na prática, a retomada do julgamento pode demorar até quatro meses para ocorrer. Isso porque, no período de recesso, os prazos não são contabilizados. 


– O prazo regimental quando um ministro pede vistas, quando fica com dúvida em relação a algum ponto específico ou sensível do processo, é de 60 dias prorrogável por mais 30 dias. Em tese, isso poderia ser até para cada um dos ministros separadamente, tanto para o ministro Sebastião Reis Júnior, quanto para o ministro Antonio Saldanha Palheiro, que foram os que pediram vistas. Mas, ao que me parece, eles se comprometeram a fazer uma análise mais breve e retornar o quanto antes, podendo ser daqui a 15 dias, um mês, é difícil precisarmos, mas, como um prazo máximo, temos esse horizonte de 90 dias – explica o advogado criminalista, Guilherme Pittaluga Hoffmeister.


A advogada criminalista e professora de Direito Luisa Motta relata que não é incomum o pedido de vista em situações complexas e de grande repercussão que exigem análises aprofundadas, como é o caso da boate Kiss. Novas dúvidas sobre o processo e possíveis mudanças de voto também podem surgir a partir da sustentação oral, levando, assim, a solicitação pelos ministros do STJ:


– Em casos complexos costumam ocorrer pedidos de vista porque durante o julgamento desses recursos surgem novas dúvidas e os julgadores precisam estar preparados para que consigam julgar de uma forma coesa e justa. A previsão de sustentação oral existe justamente para isso, porque os ministros vão acabar ouvindo a defesa e a acusação e a partir das falas podem inclusive mudar o voto.


Pittaluga também reforça essa posição ao esclarecer que, de modo geral, os ministros já chegam na sessão com os votos prontos. Contudo, em razão das sustentações orais ou da posição adotada por outro colega, o ministro pode entender que é necessário mais tempo para analisar o caso ou reconsiderar o próprio voto:


– Normalmente, os ministros vão para o julgamento com os votos prontos ou, no mínimo, quase prontos. Às vezes, há algumas circunstância que podem escapar da análise que é feita previamente e, naquele momento, o ministro visualiza que deveria ter dedicado uma atenção maior para determinado ponto. Então, ele quer adicionar aquele ponto à sua decisão e, eventualmente, até alterar a sua decisão por conta disso.


De acordo com os especialistas, não é possível prever se o restante da 6ª turma do STJ, composta pelos ministros Laurita Vaz, Sebastião Reis Júnior, Antonio Saldanha Palheiro e o desembargador convocado Jesuíno Aparecido Rissato, vai acompanhar o voto do relator, Rogerio Schietti Cruz. Por enquanto, o que resta, após 10 anos desde o incêndio na boate Kiss em 27 de janeiro de 2013, é aguardar mais um pouco por uma resposta do judiciário.


Após a decisão do STJ, o processo tem fim?

Ainda não, pois tanto defesa quanto acusação podem recorrer na última instância, o Supremo Tribunal Federal (STF)

  • Admissão do recurso especial do MPRS: o que passa a valer é a decisão do júri de dezembro de 2021, que condenou os réus. Neste caso, quem deve recorrer ao STF são os advogados de defesa
  • Negado provimento do recurso especial do MPRS: o que continua valendo é a decisão da 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), que anulou o júri de dezembro de 2021. Neste caso, quem deve recorrer ao STF é o Ministério Público do RS


– Se, porventura, for dado provimento ao recurso especial, que foi interposto pelo Ministério Público, vamos ter a anulação da decisão da 1ª Câmara Criminal, ou seja, os ministros vão manter a decisão do Tribunal do Júri de condenação. Se os ministros reconhecerem e darem provimento ao recurso do Ministério Público, a defesa poderá recorrer disso ao STF. Se for negado provimento ao recurso especial, o Ministério Público ainda tem para ser analisado o recurso extraordinário no STF.  O MP interpôs recurso especial e extraordinário do acórdão proferido em agosto de 2022, então, está sob análise o recurso especial, mas em caso de ser negado provimento, ainda tem a análise do recurso extraordinário no STF – detalha a advogada Luiza Motta.


Entenda

O incêndio aconteceu em 27 de janeiro de 2013, em Santa Maria. Morreram 242 pessoas e outras 636 ficaram feridas. O júri do Caso Kiss, que durou dez dias em dezembro de 2021, condenou os quatro réus. Os sócios da casa noturna, Mauro Hoffmann e Elissandro Spohr tiveram pena de 19 anos e 6 meses e de 22 anos e 6 meses, respectivamente. Marcelo de Jesus dos Santos e Luciano Bonilha Leão, vocalista e roadie da banda, respectivamente, que tocava na boate na noite do incêndio, tiveram pena de 18 anos.


As nulidades

Após o resultado, as defesas recorreram apresentando os recursos de apelação, em que afirmavam que várias nulidades foram registradas durante o júri. Dentre as acolhidas pelo TJRS, estão:

  • Sorteio de jurados (três ao invés de apenas um)
  • Reunião reservada entre juiz e conselho de sentença (sem a presença dos advogados de defesa)
  • Formulação de quesitos (perguntas) pelo juiz aos jurados que geraram dificuldade de compreensão
  • Inovação nas alegações (teoria da cegueira deliberada) do Ministério Público durante o júri (nulidade alegada apenas pela defesa de Mauro Hoffmann)


O pedido dos advogados foi analisado em 3 de agosto de 2022 pela 1ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS). Por dois votos a um, os desembargadores do TJRS entenderam que as nulidades eram válidas, anulando, assim, o júri. Os quatro réus, que tinham sido condenados e cumpriam penas desde dezembro de 2021, foram soltos.


O recurso especial

Depois disso, quem recorreu dessa decisão foi o Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS), que submeteu um recurso especial ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). O recurso especial é sempre dirigido ao STJ para contestar possível má aplicação da lei federal por um tribunal de segundo grau. No recurso especial do Caso Kiss, o MPRS questiona a decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.


O julgamento

Na tarde da última terça-feira (13), o STJ começou o julgamento do recurso especial. Durante a sessão, foram feitas sustentações orais da acusação (MPRS) e dos quatro advogados de defesa. Na sequência, o ministro relator, Rogerio Schietti Cruz, avaliou que não houve ilegalidades durante o júri e que os advogados perderam o prazo para fazer as manifestações que estão alegando como nulidades.


Desta forma, o ministros votou pela manutenção do resultado do júri de dezembro de 2021. Com relação ao restabelecimento das penas, o relator falou que não é possível deliberar sobre esse tópico.


Na sequência, os ministros Antonio Saldanha Palheiro e Sebastião Reis Júnior pediram vista, ou seja, mais tempo para analisar o processo. Assim, a 6ª Turma do STJ suspendeu o julgamento e nenhuma decisão foi tomada. Agora, os votos do restante dos ministros devem ser retomados em até 90 dias. Os réus seguem em liberdade até o desfecho no STJ.

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