Um minuto de barulho, máscaras e leitura dos nomes das 242 vítimas marcam as homenagens pelos 11 anos da tragédia da Kiss em Santa Maria

Um minuto de barulho, máscaras e leitura dos nomes das 242 vítimas marcam as homenagens pelos 11 anos da tragédia da Kiss em Santa Maria

Fotos:Nathália Schneider (Diário)

O vento inesperadamente frio para o mês de janeiro acompanhou a chegada das primeiras pessoas à tenda em homenagem às vítimas da boate Kiss, na Praça Saldanha Marinho. Para Santa Maria, mais um dia 26 para 27 de janeiro. São 11 anos, desde a tragédia que vitimou 242 pessoas e deixou 636 sobreviventes. A vigília aguardou até as 23h, quando cerca de 100 pessoas caminharam em direção ao prédio da boate, na Rua dos Andradas, usando máscaras com dizeres que lembram a dor e a saudade dos que se foram. 

O grupo não demorou a chegar em frente ao local, que é simbólico. Na fachada do prédio, penduraram as máscaras que traziam em seus rostos. É possível ler as mensagens assim que se aproxima, pelos refletores vermelhos apontados diretamente para elas. A intervenção foi planejada pela Associação de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria (AVTSM). 

O Coletivo de psicanálise de Santa Maria distribuiu pares de sapatos e flores para cada um dos presentes. Em dois minutos, a frente da boate estava transformada com estes novos itens. 

Abraços foram ao encontro de Carina Correa, 46 anos. Sentada em frente ao prédio, ela desejava voltar no tempo, e ter alguns minutos a mais para mudar o curso da história e poder viver junto à filha Tanise, estudante de filosofia. Na época, com 18 anos.  

– Se eu pudesse voltar e ficar aquela noite com ela, em casa, a gente ia fazer umas pizza, iamos inventar alguma guloseima para nós. Ah se eu pudesse. Ela era única, a minha nega, era muito maravilhosa. Ela tinha um abraço mais aconchegante do mundo. Tinha os olhos mais pretos, cabelo pretinho. Embora ela fosse grandona, ao mesmo tempo era tão frágil. Gostava de ler, sabe?! Ela era divina. 

Silêncio 

Às 2h30min deste sábado, momento em que se iniciou o incêndio na boate em 27 de janeiro de 2013, começaram a ser lidos os nomes das 242 vítimas. Enquanto isto, silêncio. Depois, palmas. Um minuto de barulho para lembrar do que nunca pode ser esquecido. O presidente da AVTSM, Gabriel Rovadoschi Barros, salientou estes momentos como importantes para fortalecer o grupo: 

– Antes desse segundo júri acontecer (marcado para 26 de fevereiro), existe essa expectativa, e a gente está fazendo esforço, para que consigamos validar o júri anterior. Mas, não podemos contar com isso. E é momentos como a vigília, que tá acontecendo, que possibilitam a gente ter força para continuar – lembrou Rovadoschi. 

Haverá silêncio em outros pontos da cidade neste final de semana. Conforme pedido pela associação, pelo menos 15 estabelecimentos não irão abrir em um dos dias deste final de semana, entre bares e casas noturnas, em homenagem à data. 

Afetos 

O coração de Marlowa Dias de Oliveira, 55 anos, está bem mais tranquilo nos últimos anos. Quem ouve ela falar do seu afilhado Lucas Dias de Oliveira, percebe. Ele foi umas das 242 vítimas fatais. Na época com 20 anos, o ginete deixou, entre os familiares, a sua ‘preferida’ – a afilhada, Isadora de Oliveira Benites, que em 2013 tinha 4 anos. Marlowa lembra com carinho de Lucas em mais um dia 27:

– Lucas era uma pessoa de uma pureza..  um menino que era só alegria. O Lucas, era só alegria. A Isadora realmente era o amor da vida dele.  Nos primeiros anos eu sempre trazia ela. Tem dias que eu estou com aquela saudade e é com ela que eu converso – rememora Marlowa.

Saudade dos que ficaram 

Todo "número" é o filho de alguém. Todo "número" é o irmão de alguém. Todo "número" é a família de alguém. Todo "número" é o amor de alguém. Todo 'número' é o amigo de alguém. Todo "número" é os sonhos de alguém. Todo "número" é o carinho de alguém. Todo "número" é o motivo de viver de alguém.

O texto é de Mirian Schalemberg, sobrevivente do incêndio e membro do Coletivo Kiss: que não se repita (KQNSR), e foi publicado nas redes sociais do coletivo. 

Não somos "apenas" um número.

Esta é a mensagem central da 1ª Semana de Memória às Vítimas da Tragédia da Boate Kiss, desenvolvida mediante a aprovação do projeto de Lei Nº 6839/2023. Criado pelo KQNSR, o projeto tem autoria da vereadora Marina Callegaro (PT).

Durante a semana, placas foram postas em pontos simbólicos da cidade para homenagear vítimas fatais e seus familiares. Neste sábado (27), elas ficarão próximo a rua dos Andradas, até o meio-dia. 


Prevenção

A agricultora Sandra Regina Souza, 42 anos, nunca esteve em Santa Maria próximo ao dia 27 de janeiro. Natural de Canguçu, ela disse saber da história, mas estar no local e ver os familiares é diferente, relata: 

– Como a gente tem filhos, a gente sente pela aquelas mães que estão sentindo a perda dos filhos. É uma coisa muito triste. E com isso tem muitas coisas que nos preocupa. Tenho duas filhas e elas são novas, gostam disto (festa). 

Além de se solidarizar, a tragédia Kiss também aciona outros debates – a prevenção, para que não tragédia como ela não ocorra novamente.  Neste sábado, cinco painéis de discussão estão marcados para debater este tema. Confira a programação aqui. 


Julgamento

Os quatro réus serão levados a júri após a anulação do primeiro julgamento, determinada pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJ-RS) e validada após recurso ao STJ. Com a decisão, as condenações de Elissandro Spohr, Mauro Hoffmann, Luciano Bonilha Leão e Marcelo de Jesus dos Santos perderam a validade. Eles chegaram a ser presos, mas posteriormente foram soltos.

A AVTSM entrou com recurso para validar o primeiro júri, e evitar que haja o próximo. 

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